26 de junho de 2015
Evento que acontece todo último sábado do mês, há cerca de um ano e meio no bairro do Grajaú, zona sul de São Paulo, marca presença na Virada Cultural 2015 e revela os traços da indentidade cultural da periferia.
Por Brenda Torres
A comunidade do Grajaú, formada por cerca de 1 milhão de pessoas, recebeu em janeiro de 2014 um Sarau com seu nome. Idealizado por Daniel Alexandrino e Edilene Santos, o evento acontece em um bar que também é sede do Hawaí, tradicional time de futebol do bairro. Vindos de outros coletivos culturais da periferia, o trabalho do casal foi convidado para se apresentar na Virada Cultural deste ano.
O nome surgiu como provisório e acabou se tornando oficial. “Existem muitos coletivos dentro do Grajaú, como o “Ateliê Daki” e “Sobrenome Liberdade” e é impressionante que ninguém teve a ideia óbvia de usar o nome “Grajaú”. Não que sejamos mais criativos, mas a gente simplesmente se perguntou ‘Como vamos chamar?’ e saiu “Sarau do Grajau”, porque a gente ia fazer no Grajaú e a partir do nome a comunidade se identificou. As pessoas falam Sarau do Grajaú e a gente faz no Grajaú, para o Grajaú, com o Grajaú”, ressalta Alexandrino.
A população passou a enxergar que ela existe e que ela pode produzir cultura. Além das apresentações do sarau, a comunidade está organizando eventos aos finais de semana com o equipamento utilizado no sarau que fica alocado no bar.
“Eu acho que a comunidade passou a entender que ela é importante e que ela pode produzir e criar seu próprio espaço de lazer e cultura. Uma coisa que eu costumo dizer, a gente não quer fazer sarau, a gente quer que a comunidade se aproprie do sarau”, afirma.
O trabalho que vem sendo realizado mexeu com a auto-estima dos moradores, que estão se movimento e aproveitando as oportundiade de conhecimento que o sarau está possibilitando à todos. O casal também criou uma biblioteca comunitária onde é possível pegar quantos e quais livros a pessoa quiser. Não há anotações e nem restrições quanto a data de devolução, a única ‘regra’ é que o livro seja devolvido já que é algo da comunidade.
“Eu acho que esse acesso do morador à literatura e à poesia, enfim, vai surgindo naturalmente, quando o cara percebe que o sarau é legal e tá ali no bar, tá ali do lado, e que ele não precisa ir pro centro. O morador vai tendo contato com livro, com algum escritor, ele vai ouvindo uma música diferente. Querendo ou não, para além da literatura, acaba virando um movimento social também porque as pessoas vão lá protestar, vão lá falar, se expressar de alguma maneira e reinvindicar. E aí a gente tem lá uma pequena estante com livros que é uma biblioteca comunitária”, informa Edilene.
Acontecendo há pouco mais de um ano, o sarau já ajudou muita gente a se soltar e mostrar seu talento em público, como o poeta Maurício que guardava mais de 300 poemas em um caderno que só ele conhecia e que hoje recita poesia até mesmo quando está discutindo com sua esposa, e o Valdivino que além de um grande fã de Roberto Carlos, interpreta as músicas do cantor e hoje faz seus shows no Sarau.
Auto declarados como um casal que realiza um movimento de esquerda, algo particular entre os dois, como projetos futuros é o que não falta no calendário de Edilene e Daniel. Para o fim deste ano, está programado o documentário “Grajaú em Foco” que irá registrar o trabalho dos artistas e movimentos da região. Além do projeto “Poesia nas Escolas” e apresentações de cinema e teatro na comunidade.
“Nós vamos desmistificando a arte, de forma que as pessoas comuns da comunidade, com um certo medo da câmera e até com um certo medo do microfone se olhem e digam ‘eu também posso fazer arte’, isso é que é legal”, diz o articulador cultural.
Edilene lembra que mesmo que o movimento se auto afirme de esquerda, com toda essa condição ideológica e de pensamento, ele são totalmente apartidários. “Agora a gente passa a ter o VAI como parceiro e a gente tem que colocar isso, temos sim o apoio da prefeitura. Agora toda vez que você pensa num movimento que vai falar de justiça social, que vai buscar igualdade de gênero etc, automaticamente a gente é visto como um movimento de esquerda porque é a esquerda que busca essa equiparação, essa igualdade”, defende Edilene.
“Eu costumo dizer que a gente é um movimento libertário de esquerda e que a gente anda armado. A gente é perigoso, a gente anda armardo com poesia, com verdade e com a comunidade”, finaliza Alexandrino.
Foto/Crédito: Sarau do Grajaú
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